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Review of Marx e o mundo não-ocidental

By Lucas Parreira Álvares

This review of the new translation of Kevin B. Anderson’s Marx at the Margins Margins ( ) was first published in Portuguese in Le Monde Diplomatique Brazil.


O livro oferece ao público uma investigação cuidadosa, rigorosa e de fôlego. A obra concretiza longos anos de trabalho de Kevin B. Anderson, professor da University of California, acerca da posição de Karl Marx em relação a experiências distantes do mainstream do marxismo tradicional: foge dos contextos europeus da “grande indústria” e refugia-se nas passagens sobre as formas sociais não ocidentais e/ou que precederam o modo de produção capitalista.

A causa é justificável: extinguir de vez a noção de que Marx seria um autor “eurocêntrico” ou “evolucionista”. Para tanto, Marx nas margens não se opõe meramente às críticas conservadoras a Marx, polarizando também com autores como Edward Said e Michel Foucault, caros às tradições contemporâneas de pensamento crítico. A esse propósito, Anderson convence.

Centra-se nas “margens”, mas não sem perder de vista o “centro”. Alguns leitores poderiam argumentar que Marx nas margens é um livro que apresenta um Marx deslocado de sua crítica máxima. Todavia, Anderson demonstra que Marx não relega as sociedades não ocidentais apenas a seus textos políticos e jornalísticos. Ao contrário, a importância da ênfase dada por Marx a essas questões fundamenta seus textos críticos à economia política, como O Capital e os Grundrisse.

Anderson também oferece argumentos para uma importante discussão da tradição marxista. Se por um lado alguns intérpretes acreditam que o pensamento de Marx reduz o operariado inglês da grande indústria ao protótipo de “missionário da revolução”, Anderson abre aspas para um Marx que falou em “classes trabalhadoras” em seus escritos sobre a França, que sugeriu uma “revolução escrava” em seus artigos jornalísticos sobre a Guerra Civil Americana e que vislumbrou nas comunas rurais russas a capacidade de contribuir não só para uma revolução naquele país como também ser o “ponto de partida” para o movimento revolucionário em toda a Europa. Posição condizente com o século XX, que presenciou diversas revoluções em países da periferia do sistema capitalista, como Vietnã, Cuba, Rússia, China e Moçambique.

A exposição de Marx nas margens é um convite a uma leitura agradável. A todo momento o leitor é bem situado ao texto, localiza-se pelas temáticas cuidadosamente organizadas, aprofunda-se em temas de seu interesse pelas notas de rodapé e, o principal, acompanha o aperfeiçoamento teórico e crítico do pensamento de Marx durante o desenvolvimento de sua obra. Anderson nos convida a um retorno a Marx, em um momento tão propício e urgente, que é bom não recusarmos.

[Lucas Parreira Álvares] Doutorando em Antropologia Social pela UFMG